A Psicologia, assim
como outras ciências particulares, esteve, por cerca de dois milênios, ligada ao
tronco geral da Filosofia. A palavra psicologia surgiu na Grécia Antiga. Ela é
composta de duas outras: psyché, que
quer dizer “alma”, e logia, que deriva do vocábulo logos, que significa “pensamento
racional”. Etimologicamente, portanto, psicologia representa o estudo racional
da alma, isto é, uma tentativa de compreender a alma através da razão, do
pensamento.
A concepção de alma,
contudo, não correspondia a aquela que é comumente conhecida em nosso tempo. Ao
longo das épocas, ela foi sendo reformulada através do pensamento de vários
filósofos. Os “estudos sobre a alma”, se assim podemos dizer, foram se transformando
até que assumissem a forma da Psicologia que conhecemos nos dias de hoje.
A história da
psicologia nos leva, em um primeiro momento, à Antiguidade, mais especificamente
à Grécia Antiga, onde floresceu uma forma particular de conhecimento da
natureza e dos seres humanos, a Filosofia. Como destaca Marilena Chauí:
A
Filosofia surgiu quando alguns gregos, admirados e espantados com a realidade,
insatisfeitos com as explicações que as tradições lhes dera, começam a fazer
perguntas e buscar respostas para elas, demonstrando que o mundo e os seres
humanos, os acontecimentos naturais e as coisas da natureza (...) podem ser
conhecidos pela razão humana, e que a própria razão é capaz de conhecer a si
mesma. (2009, p.25)
Assim como dedicaram
sua atenção à tentativa de compreender a ordem da natureza (o cosmos), os
filósofos gregos também se ocuparam do estudo da alma através da razão, ou
seja, da psicologia.
Sócrates |
Platão |
Platão, discípulo de
Sócrates, como destaca Anna Paula Rodrigues Mariano, divide o homem em corpo e alma. “Para ele, o verdadeiro
conhecimento está inserido no mundo das ideias, que faz parte de uma alma já
inteligente antes de habitar e se tornar prisioneira do corpo”. A alma, assim,
seria como um habitat do verdadeiro conhecimento.
Aristóteles |
No pensamento de
Aristóteles, introduz-se novamente um novo conceito. A alma, para o filósofo, é
o princípio que dá vida à substância do ser, aos corpos físicos. Não pode, portanto,
ser vista separadamente do corpo. É como se a alma fosse responsável por animar
a matéria, por conferir vida a ela. O filósofo de Estagira chegou a estabelecer
distinções entre a percepção, a razão e as sensações, diferenças que seriam
abordadas muitos séculos mais tarde, por Husserl e pela Psicologia da forma ou
teoria da Gestalt.
Durante a Idade
Média, ganhou contornos relevantes o pensamento de Santo Agostinho. Inspirado
em Platão, ele também enxergava uma separação entre alma e corpo. Para ele,
contudo, a alma não era apenas a sede do pensamento, mas o elemento imaterial que
liga o homem a Deus. Sendo a alma a sede do pensamento, a Igreja passou a se
preocupar com sua compreensão.
Outro grande
pensador da escolástica, São Tomás de Aquino, inspirado pelas ideias de
Aristóteles, também elaborou estudos sobre a compreensão da alma. A alma, para
o pensador medieval, é a responsável pela espontaneidade da vida. A alma dos
animais e vegetais seria puramente sensitiva, como se a alma destes os
permitisse apenas a espontaneidade vinculada ao sensível, ao corpo, às suas
necessidades. A alma humana, por outro lado, teria natureza diversa, sendo
incorporal, insubstancial, e daria ao homem muito mais que a espontaneidade de
atos físicos. Ela permitiria ao homem a possibilidade de construir pensamentos.
René Descartes |
Tempos depois, com o
Renascimento, René Descartes, filósofo, físico e matemático francês, trouxe uma
enorme contribuição à formação da Psicologia. Ele aceitou a posição dualista,
que considera que mente (ou alma) e corpo são coisas distintas, mas declarou que
tinham funções diversas. O corpo teria a função de permitir a sobrevivência,
enquanto a mente a de pensar. Descartes propôs ainda que existiria uma
interação mútua entre a mente e o corpo. Ora, mas, antes de mais nada, onde
estaria a mente? Para o filósofo, no cérebro. A glândula pineal, por sua vez,
estrutura localizada entre os hemisférios cerebrais, seria responsável pela
conexão entre o dispositivo pensante e dispositivo executivo. Descartes, assim, faz com que as atenções se voltem
para a mente, algo que se relaciona mutuamente com o corpo. Fornece, portanto,
estímulos para que a anatomia e a fisiologia humanas sejam estudadas, a fim de
se descobrir mais sobre essa interação e, consequentemente, sobre a estrutura
dos pensamentos. O foco das atenções vai se desvencilhando da noção de alma,
até então muito vaga, para a de mente, local onde o pensamento é processado.
Outro ponto do
pensamento de Descartes que merece ser destacado é a distinção entre a razão
inata e a adquirida. Para ilustrar a diferença, podemos imaginar um computador. Nele, é possível identificar dois “segmentos de
software”, se assim podemos dizer. O primeiro grupo de softwares é aquele que
fornece instruções básicas de funcionamento, controle e interação dos dispositivos
de hardware. Este grupo de softwares representaria a razão inata. Nós,
usuários, não os instalamos em nossas máquinas, pois eles já vem com elas.
Aliás, a máquina sequer poderia funcionar sem sua presença. O segundo grupo de
softwares representaria todos aqueles que instalamos em nossos computadores,
como um aplicativo para ver vídeos, por exemplo. Estes softwares representariam
a razão adquirida.
John Locke - considerado o fundador do empirismo britânico. |
Antes da morte de
Descartes, já havia surgido na Inglaterra o Empirismo, que pretendia discutir o
desenvolvimento da mente e o modo como ela adquire o conhecimento. Os
empiristas, de modo geral, acreditavam que nossos conhecimentos surgem com a
experiência dos sentidos, ou seja, com as sensações. Os objetos ao nosso redor
excitam nossos órgãos sensoriais e vemos suas formas, cores, sentimos seus cheiros,
suas temperaturas etc. O conhecimento, para os empiristas, seria obtido través
da associação dessas sensações, o que formaria a percepção. Essas associações
só seriam possíveis graças à repetição e à sucessão de estímulos externos e de
nossos hábitos.
O empirismo, assim,
com a ideia da experiência sensorial, estimulou o desenvolvimento da Fisiologia
e da Neurofisiologia, uma vez que se procurava entender como os sentidos
funcionavam. Os avanços na área neurofisiológica, por exemplo, “levaram à
formulação de teorias sobre o sistema nervoso central, demonstrando que o
pensamento, as percepções e os sentimentos humanos eram produtos desse sistema”
(BOCK;
FURTADO; TRASSI, 2009, p.). A Psicologia, isto é, o estudo racional da mente, começava, assim, a percorrer
os caminhos da Fisiologia, a Neuroanatomia e a Neurofisiologia.
Por volta de 1860, é formulada a Lei de Fechner-Weber. Essa lei, em
resumo, pode ser entendida através de uma análise rápida do gráfico abaixo.
Trata-se do gráfico de uma função logarítmica. A resposta a um estímulo
(uma sensação) é representada pela letra grega “Ψ” (eixo Y). A intensidade do
estímulo (estímulo físico), por sua vez, é representada pela letra “I” (eixo X).
Da análise do gráfico, é possível perceber que a resposta a qualquer estímulo é proporcional ao logaritmo da
intensidade do estímulo. A função
é: Ψ = k*logI, em que “k” é uma constante. Essa
lei pode ser usada, por exemplo, para calcular a resposta a um estímulo sonoro,
visual etc.
Esta lei foi de grande importância para a
Psicologia, pois descortinou a possibilidade de mensurar um fenômeno
psicológico, algo até então considerado impossível. Dessa
forma, os fenômenos psicológicos vão adquirindo status de científicos, uma
vez que, para a concepção de ciência da época, o que não era mensurável não era
passível de estudo científico.
Wilhelm Wundt |
A Psicologia vai, assim, gradualmente, se desvinculando do tronco geral da Filosofia, adquirindo um objeto próprio de estudo, métodos e teorias próprias.
Embora a Psicologia tenha nascido na Alemanha, como
dissemos, é nos Estados Unidos que surgem as primeiras abordagens ou escolas em
Psicologia, as quais deram origem às inúmeras teorias que existem atualmente.
Cuida-se do Funcionalismo, do Estruturalismo e do Associacionismo. A Psicologia
científica se constituiu, assim, em seus primeiros passos, destas três escolas.
.
Mais tarde (séc. XX), contudo, essa Psicologia científica
foi substituída por novas teorias, como o Behaviorismo, a Gestalt e a
Psicanálise..
REFERÊNCIAS:
BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lourdes
Trassi. Psicologias: uma introdução ao estudo de
psicologia. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
CHAUÍ,
Marilena de Souza. Convite à
filosofia. 13. ed. São Paulo,
SP: Ática, 2009.
GAARDER, Jostein. O
mundo de sofia: romance da história da filosofia. 1ª ed. São Paulo, SP: Cia das Letras, 2011.
MARIANO, Anna Paula Rodrigues. Um pouco sobre a história da
psicologia. Disponível em <http://www.espacocuidar.com.br/psicologia/artigos/um-pouco-sobre-a-historia-da-psicologia>.
Acesso em: 04 de novembro de 2012.